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Vergonha: típico de Brasil

"Assim é, se lhe parece"...

Roberto Rocha (*)
O Brasil desfruta da inglória fama de campeão mundial do desmatamento. A cada ano, os satélites que nos orbitam mandam mensagens mais alarmantes sobre o avanço da destruição das nossas florestas. Todo cuidado é pouco, mas convém lançar um olhar histórico sobre essa infame notoriedade.
Mais de 75% das florestas do planeta já desapareceram. A África mantém hoje apenas 7,8% de sua cobertura vegetal original. A Ásia, 5,6%, a América Central, 9,7% e a Europa, apenas 0,3%. Contudo, o Brasil, com a fama de vilão mundial, mantém intactas 69,4% de suas florestas primitivas. A tal ponto nós nos distinguimos do resto do mundo que, há 8 mil anos, a área onde está o Brasil detinha apenas 9,8% das florestas mundiais, mas hoje, a despeito do nosso ritmo de desmatamento, respondemos por 28,3% do total.
Bem o disse Shakespeare na comédia Assim é se lhe parece, que o mundo é um palco e nele somos todos atores. Coube ao Brasil o papel de vilão nessa grande encenação.
E nem se diga que nosso exitoso desempenho derive de inércia histórica. Além do extraordinário legado indígena que ao longo de milhares de anos preservou o meio natural, já no Brasil Colônia as ordenações reais criaram regras para a exploração da vegetação protegendo algumas árvores que ficaram conhecidas até hoje como madeira de lei. Em 1797, as cartas régias consolidaram nossas primeiras leis ambientais, sujeitas ao severo exame dos Juízes Conservadores.
Muitos outros marcos legais se sucederam como nobres precursores do nosso atual ordenamento jurídico ambiental. Podemos e devemos nos orgulhar dessa herança bendita que forjou uma inteligência crítica contínua sobre a questão.
No percurso da nossa história, o desmatamento em ritmo insustentável é fenômeno relativamente recente. O avanço da fronteira agrícola acendeu os sinais de alerta.
Para medirmos o risco real do problema um bom começo é saber exatamente qual a situação hoje. Para isso, a Embrapa realizou extensa pesquisa, sob coordenação do Dr. Evaristo Miranda, versando sobre o Alcance Territorial da Legislação Ambiental e Indigenista. O estudo mapeou, com base em imagens de satélite e cartografia digital, quanta terra está legalmente disponível para a atividade agrícola no Brasil. Os resultados mostram que, descontadas as unidades de conservação, as reservas indígenas e as áreas de reserva legal e de proteção permanente, restam cerca de 31% para a ocupação agrícola. Pode parecer pouco, mas é terra suficiente para alimentar mais de um bilhão de pessoas.
O problema é que boa parte das terras protegidas já está ocupada, criando, dessa forma, um enorme abismo de conflitos entre a legitimidade e a legalidade do uso. Diversas culturas tradicionais, como o arroz nas várzeas do Maranhão ou as vinícolas de Santa Catarina passaram à ilegalidade em face das restrições das últimas medidas de proteção. Conflitos já começam a chegar ao Supremo Tribunal Federal.
É necessário compatibilizar a letra e o espírito da lei para que esse impasse não agrave a governança territorial, gerando conflitos policiais e impedimentos produtivos. Nesse cenário, todos perdem.
Não admira que as discussões em torno da revisão do Código Florestal venham gerando mais calor do que luz. Carecemos de parâmetros de discussão claros em torno de um projeto de nação que contemple a questão ambiental, não como uma variável restritiva, mas uma condição necessária e um capital de oportunidade. Precisamos ser capazes de repactuar nosso ordenamento territorial definindo, para início de conversa, algumas premissas básicas tais como o absoluto respeito aos territórios indígenas e às unidades de conservação, a decisiva e pétrea determinação de conter o desmatamento, bem como o respeito às culturas tradicionais e ao valor social do trabalho no campo.
Devemos separar o joio predatório de má fé do trigo das atividades seculares de cultivo. É imperativo sentarmo-nos em torno das convergências, que nos aproximam, ao invés dos dissensos que nos afastam. É hora da generosa idéia do desenvolvimento sustentável deixar de ser brandida mais como uma bandeira política do que um compromisso social.
Esse é o desafio que teremos que enfrentar. Seremos dignos da nobre herança que recebemos dos nossos antepassados?
* Roberto Rocha (PSDB/MA) é deputado federal e presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
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